O Poço do Visconde

Meu pensamento se enche entusiasmo, viajo para o sítio, e revivo os lugares e personagens que conheci antes de ver a sugestões da TV. Queria que ele visse quanto o Brasil já progrediu em relação ao petróleo... Quantas metáforas poderia construir com a brilhante geologia de rica linguagem infantil: material orgânico sedimentado, riqueza enclausurada, suprimento abundante, de difícil acesso, de alto valor - que pode ser transformado em energia quase inesgotável - apenas com iniciativa e trabalho...com desejo, coragem e fé...



Ah! Quem me dera, Monteiro Lobato, tomar um café contigo...
Eu me encheria dessa paixão que sai aos jorros de você, alma imortal, furaria meus poços, colocaria uma torneira bem forte para dosar a pressão e não destruir, nem desperdiçar nada, e seria muito, muito, muito, rica... de bens, de amor, de desejos, de sonhos e de realidades!!!!!!!!!!!

O corpo traído

O corpo traído

Isabelle Ludovico
O excelente livro de Alexander Lowen, com este título, aponta a síndrome mais freqüente de nossos dias: a cisão entre corpo e alma como forma de se proteger da dor. Vivemos numa cultura que valoriza o conhecimento teórico em detrimento do sentimento, o poder em detrimento do amor, a ação em detrimento da emoção e a mente em detrimento do corpo. 
As emoções têm um registro corporal. É o corpo que sente tesão, se arrepia de medo e treme de raiva. A criança descobre logo como prender a respiração e amortecer o corpo para evitar o medo ou uma ansiedade muito forte. A emoção reprimida, por meio do autocontrole, se transforma em angústia e no medo de perder este controle.
É como uma bomba que não explodiu. Sem a consciência do corpo e das emoções, a pessoa se torna um espírito desencarnado e um corpo desalmado. O corpo, com seus sentidos, é sacrificado e submetido ao controle da mente. Come-se porque é meio-dia e não porque se sente fome. 

No indivíduo integrado, o desejo de prazer gera um impulso que desperta sentimento, pensamento e ação. Corpo e mente são ligados pela função integrativa do prazer. Ao suprimir o medo, suprime-se também o desejo e o prazer. A unidade mente/corpo passa a ser mantida artificialmente pela força de vontade. Alienada da sua identidade corporal, só resta à pessoa identificar-se com uma imagem compensatória e irreal de si mesma. O corpo se torna uma vitrine, um objeto moldado em função de critérios estéticos definidos pela sociedade. O sexo compulsivo se apresenta como uma forma de obter proximidade e calor. Pensamentos e fantasias substituem o sentimento e a ação destinada a satisfazer algum desejo. O amor é romanceado para compensar sentimentos genuínos. A pessoa se torna escrava de papéis e desenvolve seu trabalho de forma mecânica. Ela se dedica a empreendimentos egoístas que possam alimentar o culto à imagem ideal de si mesma que ela sobrepôs à realidade e ao corpo.
Quando a criança é seduzida por um dos pais, ela também se protege abandonando o seu corpo. Por outro lado, a ausência de uma intimidade física prazerosa com a mãe é sentida como abandono. Por medo de se sentir abandonada, a criança suprime o sentimento e o desejo e passa a evitar a intimidade. Sem consciência corporal, ela duvida que suas pernas sejam capazes de sustentá-la. É condenada a viver suspensa entre a realidade e a ilusão, entre a infância e a maturidade, entre a vida e a morte. Ela rejeita seu passado, se sente insegura em relação ao seu futuro e não possui presente já que não tem chão firme sob seus pés.
Recuperar o corpo significa resgatar essas emoções contidas debaixo da máscara que esconde que a pessoa está “morta de pavor”. Remover a máscara significa encarar o medo e a raiva. Abandonar a imagem ilusória de si mesmo pode parecer um mergulho no desespero, porém traz a surpresa de descobrir um chão seguro. Não se pode cair mais baixo do que na mão de Deus. A dor reprimida voltará logo que a pessoa restabelecer contato com seu corpo. Assim como o dedo congelado dói quando começa a esquentar, esta dor provém da luta que o corpo trava para ganhar vida. No caminho para a recuperação a pessoa irá passar por uma fase de profunda exaustão que pode durar semanas ou até meses. Nesse processo, a dor será substituída progressivamente por prazer e o desespero por sentimentos positivos. 
Assim, o prazer só é acessível a quem não se desvia da dor e a trilha da alegria esbarra inevitavelmente na tristeza. A capacidade de sentir dor é também a capacidade de sentir prazer. Entregar-se ao cansaço é encontrar a paz do repouso. Querer poupar-se de emoções desagradáveis é condenar-se a viver num vácuo frio e sem vida. Como diz a música: “Quem quiser encontrar o amor, vai ter que sofrer, vai ter que chorar...” O sofrimento e a dor fazem parte da experiência humana assim como o amor e o prazer.
Ao resgatar sua identidade corporal, a pessoa torna-se capaz de perceber o que quer, o que sente e de que necessita. Assim, ela pode satisfazer os seus desejos e anseios. Esse processo rumo a uma vida mais integrada pode ser acompanhado por um terapeuta que enfrentará o desespero junto com o paciente e o ajudará a enxergar luz no fim do túnel. É imprescindível segurar na mão de Deus para entrar nesse vale da sombra da morte onde estão entulhadas as emoções negadas. Abrir mão da imagem de super-homem para se tornar um ser humano de carne e osso, com luz e sombra, com emoções e desejos, é o grande desafio da nossa época que cultiva o narcisismo, o ativismo e o consumismo em vez de reconhecer que o sentido da vida reside fundamentalmente em amar e ser amado.

Isabelle Ludovico da Silva é psicóloga clínica, com especialização em Terapia Familiar Sistêmica. 
E-mail: isabelle@ludovicosilva.com.br